Quem sou

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Vocação: Padre - Outras ocupações: artista de ilusionismo e hipnotismo

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

ERA UMA VEZ…PARA QUEM AS ESTÁTUAS?




Ou… PARA QUEM AS ESTÁTUAS?

Lembro-me, dos meus tempos de escola e do enlevo com que ouvia da boca da Professora a descrição feita acerca dos diversos episódios da nossa História pátria. Fazia isso com tanto entusiasmo, como se tivesse tomado parte activa em todos os acontecimentos que narrava com a arte de quem, havia muitos anos, navegava no assunto e tinha a lição na ponta da língua. Nós é que não engavetávamos, na cabeça, as coisas da mesma forma. Se fosse hoje, de certeza que, sofregamente, arregalaríamos os olhos para não perdermos pitada. É que o filme parecia de tal modo vivo que, nesta nossa idade presente, se transformaria em momentos interactivos por excelência, não haja dúvida.
Para além das batalhas e escaramuças da sociedade daqueles tempos passados, muitas outras coisas se fizeram de útil. Quase, por isso, queremos, hoje, desculpar os desvios e mazelas morais que vêm à tona do nosso conhecimento. Alguns reis e príncipes, já naquela altura, também eram frescos para assar, segredava-nos a mesma nossa Professora, embora não percebêssemos o que significaria tal expressão.
As suas memórias reais continuam perpetuadas por épocas imorredoiras. Queremos, e acreditamos que assim seja, até porque há personagens que são incontornáveis e intocáveis. Aprendi isso e, ainda, não foi feito desmentido nenhum.
Por segura razão, agora, passamos nós por inúmeras estátuas que proliferam no meio das praças públicas, convidando-nos a mergulhar nos exemplos de trabalho e de desprendimento dos homens e mulheres, em tempos que já lá vão.
Porém, é com lástima, verdadeiramente sentida, que observamos a muita falta de respeito em relação a monumentos desta natureza, conspurcados por todas as formas e feitios, como não é difícil constatar. Também não admira que suceda desse modo quando alguns desses marcos foram, tacitamente, mandados derrubar. Triste indício para quem, algum dia já pensou “ver” erigido algum padrão em defesa de algo que pensa estar a fazer de positivo. As gerações vindouras lhes tratarão da recompensa.
Pessoalmente, respeito o simbolismo dos memoriais. Acho que muito teremos a aprender com todas essas pessoas ilustres porque fizeram de nós um povo que se identifica com a sua História e dela se orgulha. É que assistimos a façanhas e artimanhas no campo da moral e
da economia, operadas por gente de camisa lavada e gravata engomada, as quais envergonhariam qualquer aldeão habituado a pagar o último cêntimo das suas dívidas ou a entregar o porta-moedas por si achado no meio da rua, a serem ilibados de todas as acusações e culpas, libertados de quaisquer encargos e, no fim, receberem indemnizações pelos “maus tratos” infligidos às suas dignidades. Virá, até e em breve, a estátua recordativa.
Desconfio é se, na verdade, indivíduos que hoje querem continuar as suas epopeias de interesses pessoais reconhecidos e desmascarados têm estofo para se aguentarem direitos, em cima dos seus pedestais feitos de materiais tão fragilizados.
Por mim, não reservo inveja por quem quer que seja, nem quero ser importante e, muito menos por certos caminhos, e recomendo, desde já, não me querer “ver” transformado em pedra ou bronze. Receio o que pode seguir-se. Concretamente expressei, já um dia e por chiste, a minha contemplação e reflexão sobre o busto inaugurado em memória de alguém. Perdoem-me, mas, sem mais, aqui vai a minha produção rebuscada em sebenta velha e que reza assim, ainda hoje:
A ESTÁTUA
Sempre olhei com muita graça
Para quem vive em pedestal,
Sujeito à mofa de quem passa,
- Grande ou pequeno ou animal.
Casaco debaixo do braço,
Nos ombros a grande sacola,
Cabeça no ar, e olhar baço,
Mão estendida a pedir esmola.
É refúgio dos namorados,
É papel para se riscar;
E os ditos autografados,
Depois, se irão lá recordar.
Entre risos e galhofadas,
Cada um lê o que escreveu;
E a estátua aprende, às pitadas,
O que em nenhuns livros leu.

Vem um cão e, muito ligeiro,
- Pois não é a primeira vez!...
Levanta a pata e faz… xixi;
Vem o homem, e olha primeiro,
Não vê ninguém, e, então diz:
- Não há remédio, é mesmo aqui.

Homem-estátua, penso eu:
Quem tu foste e agora és…
Na vida, tudo te mordeu;
Na morte, mijam-te nos pés.

Cada um que tire a respectiva conclusão. Eu, já não tenho tempo.
P. Manuel Armando

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