Ouço ao longe, ecoando, um grito
De alguém que brada pela minha presença;
Não é a fantasia
E, muito menos, utopia
Mas, isso sim,
Perto de mim,
A realidade da vastidão imensa
Onde se misturam a fé e o mito.
Há que mergulhar nas entranhas do mistério,
Romper as peias da vergonha e do medo,
Escancarar as portas que, tarde ou cedo,
Vão mostrar a vida pelo lado mais sério.
Sinto o meu mundo cercado de desconfiança
E tento esquecer-me do convite de antanho;
Escorrego, caio, estatelo-me na ribança,
Como o cego com seu olhar tacanho
Quando tropeça na própria figura
E se afunda ainda mais na desgraça
Do esquecimento e desdém daquele que, porventura,
O conhece, mas despreza e ignora,
Enquanto se pavoneia nos caminhos por onde passa
E, na arrogância infame da chalaça,
O encara, de soslaio, e se vai embora.
Subamos, em grupo, ao monte da elevação,
Com humildade e esforço na persistência;
Diante de todos nós a enorme vastidão
Dum mundo que se esgota no gozo e diversão,
Entregue aos devaneios da mentira e violência.
O Espírito, na caminhada, é nosso Consolador e guia
A dar sentido ao trabalho de cada dia,
Enquanto o Senhor nos sacode e envia
Como testemunhas de coragem e alegria.
Em Cristo, também o Homem é ressuscitado
E há-de vencer o túmulo do pecado.
Aos outros irmãos vamos, pois, anunciar
Que a Verdade a todos vem libertar.
Na desconfiança relutante e teimosa incerteza
Que me assaltam a todo o momento,
Assumo a minha miserável e arrogante natureza;
Por isso, a Ti, Senhor, rogo o perdão e o alento;
Minha vida seja, da Tua vontade, instrumento.
Então, jamais, eu duvide da Tua presença
Prometida para todos, e em qualquer momento.
No meio dum mundo de infidelidade intensa
Eu sirva e anuncie o único projecto do amor
Que descobre e mostra o Teu rosto, Senhor.
Manuel Armando
(Reflexão para o 7º Domingo da Páscoa – Ascensão, Ano A)