Quem sou

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Vocação: Padre - Outras ocupações: artista de ilusionismo e hipnotismo

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

A PEDAGOGIA DO RADAR

         Há imagens que permanecem indelevelmente impressas na nossa memória pessoal e, porque remontam aos tempos de frescura na gravação, lá ficam como se acontecessem em qualquer lapso presente. Ou, então, sucedem-se acasos que nos abrem o subconsciente, escancarando-o com toda a sua verdade lá contida.
         A atitude do gato, quando coca o rato, ou a posição do cão, ao farejar determinada peça de caça, quase nos fazem lembrar, concretizando, aquelas ideias que alimentamos no agir de pessoas e instituições.
         É claro que me pronuncio como despeitado que sou, mas tenho muito prazer em, resumidamente e sem grandes pormenores, contar um pequeno episódio de estrada que, jamais, esquecerei.
         Viajava eu, com alguma pressa quando, levantando a mão, alguém com autoridade me interrompeu a marcha. Depois dos cumprimentos habituais, não precisou de examinar quaisquer documentos porque, por um mero acaso, reconheceu a minha pessoa. Breve conversa cordial sobre família e despedida, sem mais. Só que, quando eu procurava reiniciar a viagem, a mesma mão me acenou. Baixei o vidro da janela do meu lado e ouvi, no momento, num misto de fina ironia e amizade: “Já agora, olhe, com essa velocidade, ponha o cinto de segurança”. Sorriu e nada mais acrescentou. Não fui multado mas senti-me pior do que se o fosse.
         Apenas, mais esta nota: ainda hoje, não sou capaz de identificar o guarda. Todavia, aqui fica registado, assim deste modo, o preito da minha homenagem pelo seu saber ser pedagogo.
         Isto vem a propósito da forma como, por vezes, se reprimem as pequenas distracções dum pobre condutor que utiliza o seu carro para deslocações de trabalho e não em qualquer espécie de competição.
         A presença duma autoridade fardada não se faz mostrar para impor, no bom sentido, o respeito pelas regras, sinais e pessoas. Mas, isso sim, transformam estes muitos condutores em títeres do medo e da carga psicológica negativa, porque conduzem na constante perspectiva e pânico de o veículo ser “fotografado”, mesmo que ultrapasse, na velocidade, só um pontinho além do permitido.
         Carros não identificados, estacionados nos locais escondidos ou escuros, oferecendo até ocasião a uma aprazível sesta porque a máquina programada faz todo o trabalho por ela própria, são praga constante.
         Pessoalmente, confesso que já despendi a quantidade necessária dos euros suficientes e capazes de adquirir também uma aparelhagem semelhante para, eu mesmo, gravar o andamento daqueles tantos “fângios” que me ultrapassam, em altas rotações, certamente com a sorte de nada lhes acontecer.
         É o que temos; caçadas, entre montes e na ausência de cães, com licenças especiais e gratuitas.
         Já nem conseguimos topar, sem um calafrio esquisito a gelar-nos os ossos, um veículo parado em qualquer berma nem que seja por espera do dono que, em dificuldades e necessidades naturais, se apeou em busca do esconderijo duma árvore amiga.
         Há uma forma de educar e outra de reprimir.
         E eu, quando for grande, hei-de ter um radar que detecte outros radares.
         É, por isso, a pedagogia do radar que poderá não educar mas, naturalmente vai originando depressões nervosas ou psicoses difíceis de engolir ou esquecer.

                                                                            
                                                                               Manuel Armando


        

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