E EU, NÃO VALHO NADA?
Ainda bem que
alguém, vão lá poucos anos, consignou o meu direito à indignação.
E sendo assim,
em qualquer momento, esteja onde estiver, nas diversas latitudes da minha
existência posso, porque devo, indignar-me. E mais; ninguém se atreva a chamar
e, muito menos, considerar-me um verdadeiro doido. Aí a minha indignação seria
alargada para muito longe.
Se tenho
direito, devo exercê-lo sobretudo quando as razões, mesmo tidas como simples,
são imperiosas e pertinentes. É uma questão de observação humana racional que
não pode ficar calada. Não importa haver desacordo entre nós humanos, pois cada
cabeça deve pensar de modos diversificados sem molestar as opiniões alheias.
O grande
benefício que nos assiste é o dom da liberdade fundamental inerente à criação e
da qual jamais alguém nos pode espoliar, sob pena de contraditar a ordem
natural das coisas e pessoas.
É verdade que
sempre houve sistemas políticos e sociais ou sociológicos a espartilhar esta
prerrogativa, todavia também, com toda a frequência e naturalidade, apareceram
vozes discordantes denunciando abusos tendenciosos a forçarem regressões
importantes.
Então, porque
me considero livre e com alguma capacidade de reflexão, retomo a razão da minha
indignação.
É que penso não
valer nada, ou ponho a dúvida, porque ninguém me quer comprar, ou pelo menos
não dou por isso nem os meus supostos empresários se mexem nesse sentido.
Também é a
verdade pura que eu não estou no famoso escaparate das vendas nem tenho rótulo
de nada. Por isso, sou um ilustre desconhecido.
Então, qual o
real motivo da minha indignação?
É muito
simples: Compram-se e vendem-se pessoas, pelos preços vergonhosamente
exorbitantes e acintosos de milhões, para darem uns pontapés na vida a
entreterem meio cento de apaniguados. E até se exaram cláusulas astronómicas
que salvaguardam quaisquer rescisões contratuais.
Não é por nada,
mas existem também milhões de sardinhas ou pãezitos que poderiam ser comprados e
matariam a fome em milhões de crianças ou adultos mas, para isso, não se dispõe
de um cêntimo no fecho de tal negócio. Dizem que é por causa da crise. Entendo.
Volto atrás na
minha indignação e que ninguém tenha a ousadia de tentar comprar-me, seja pelo
preço que for e da forma julgada mais capaz porque, já agora, prefiro
emparceirar com aqueles que vêem a sua dignidade no pouco que produzem mas com
utilidade para toda a comunidade, enquanto muitos outros correm no estádio à
procura da coroa que desaparece como o fumo.
A razão
assistia ao Apóstolo Paulo quando escreveu para os Coríntios isto: “Não sabeis
que no estádio todos os atletas correm, mas só um ganha o prémio? Portanto,
correi para conseguir o prémio. Os atletas abstêm-se de tudo; eles, para ganhar
uma coroa perecível; nós, para ganharmos uma coroa imperecível. Quanto a mim,
também eu corro, mas não como quem vai sem rumo. Pratico o pugilato, mas não
como quem luta contra o ar. Trato com dureza o meu corpo e submeto-o, para não
acontecer que proclame a mensagem aos outros, e eu mesmo venha a ser reprovado”
(1Cor.9,24-27).
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